quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Revisão nos contratos administrativos

Por se falar em contratos, em todos os ramos do direito, mister falar-se na teoria da imutabilidade das cláusulas contratuais.
Representada pela expressão latina pacta sunt servanda, encontra significado na máxima “o contrato faz lei entre as partes”. Unindo ação às palavras, os contratos seriam imutáveis, ainda que por justa razão superveniente – não alterados, não revisados: cumpridos.
O princípio da força obrigatória, entretanto, encontra oposição no algo neófito rebus sic stantibus, isto é, a teoria da imprevisão, que visa diretamente a igualdade entre as partes.
Zunino Neto ensina que antes da promulgação da Constituição vigente, a doutrina estabelecera a nulidade ou resolução do contrato como soluções para qualquer falha insanável que impedisse seu cumprimento (tal como o não preenchimento dos requisitos essenciais para contratação).
Entrementes, a nova legislação, a exemplo do Código de Defesa do Consumidor, bem como a jurisprudência em peso, tem identificado na revisão instituto mantenedor da legalidade e do bem comum.
Também o direito administrativo acha baliza nos brocardos da imutabilidade e da imprevisão. É correto afirmar, portanto, que os contratos administrativos devem ser cumpridos, exceto em caso de desequilíbrio entre as partes contratantes. Quando dessas ocorrências, é cabível a revisão do contrato.
A revisão, assim, acha-se intrinsecamente relacionada ao equilíbrio econômico-financeiro das partes, repetidamente referido como “equação econômico-financeira”. Kléber Martins de Araújo a conceitua como permanente equivalência entre os encargos suportados pelo particular e a remuneração a ele paga pela Administração.

Ora, estando o particular cumprindo seu encargo contratual, bem como a Administração honrado com a respectiva remuneração, e não havendo disparidade entre as respectivas obrigações (encargo-remuneração), conclui-se que as partes encontram-se nas mesmas condições de quando da celebração do pacto, não lhes assistindo, portanto, quaisquer justificações plausíveis para tentar se esquivar do cumprimento de suas cláusulas, por mero capricho ou motivo irrelevante, senão por eventos que tornassem o negócio demasiadamente oneroso para qualquer deles, ou nos casos de alteração unilateral do contrato pela Administração em virtude do princípio da supremacia do interesse público.

O citado equilíbrio tem esteio na própria Constituição Federal, art. 37, inciso XXI, que traz o seguinte texto:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:[...]
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.


Em semelhante redação, o chamado Estatuto da Licitação, Lei nº 8.666/93 preleciona:

Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:[...]
II - por acordo das partes:
[...] d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando área econômica extraordinária e extracontratual

Novamente, a revisão surge nesse contexto como forma de relativizar o princípio da força obrigatória. Outras formas de relativização restam nas denominadas correção monetária e reajuste – este último previsto no contrato, por ser devido a fatores previsíveis que requeiram alteração de valores. A revisão aparece, outrossim, como o único meio flexibilizador do pacta sunt servanda que se baseia no rebus sic stantibus.
Exemplo prático para o recurso em tela se dá com a atualização das alíquotas da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social - COFINS sobre o contrato ajustado, causando prejuízo para a parte.
Em síntese, o contrato administrativo não pode ser tido como intangível ou imutável, a menos que com isso se queira apontar uma regra sem abarcar suas exceções. A revisão é uma delas, na sua qualidade de instituto relativizador do princípio pacta sunt servanda.
Essa relativização só é possível através da teoria da imprevisão, que permite que fatos ulteriores imprevistos e imprevisíveis acarretem a revisão e possível alteração ou resolução do contrato, a fim de que seja preservado o equilíbrio entre os contratantes, no que tange a suas condições econômicas e financeiras. A preocupação com a conservação da equação mencionada provém mesmo de disciplina do legislador, como manda o princípio da legalidade na Administração, e de crescente interesse da doutrina.
Destarte, revisão em contrato administrativo é possível e cabível nos termos examinados, com a finalidade última de proteger a justeza do contrato e o interesse público.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Kleber Martins de. Contratos administrativos: cláusulas de reajuste de preços e reajustes e índices oficiais . Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: . Acesso em: 27 out. 2008.

Boletim Informativo de Licitação da Procuradoria Geral do Município - nº 18 - Junho. São Paulo, 2004. Disponível em: http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/negocios_juridicos/licitacoes_boletins/0018. Acesso em 27.0ut.2008.

ZUNINO NETO, Nelson. Pacta sunt servanda x rebus sic stantibus: uma breve abordagem. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 31, maio 1999. Disponível em: . Acesso em: 28 out. 2008.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Considerações sobre o Regime Jurídico das Entidades da Administração Indireta

1. INTRODUÇÃO


O trabalho que será delineado visa lançar algumas luzes sobre o tema do Regime Jurídico das Entidades da Administração Indireta, tema complexo que suscitará a análise dos Regimes de Direito Público e de Direito Privado.
Num primeiro momento será apresentada uma introdução ao tema do regime jurídico, explicando sua definição e explicitando os que existem com as peculiaridades que lhes são inerentes.
Depois, trataremos de expor quais entidades compõem a Administração Indireta, seu conceito e breves características, o que nos fornecerá subsídios para analisar o regime jurídico que adotam.
Superada esta etapa partiremos para o tema central do trabalho fazendo as considerações pertinentes ao Regime Jurídico das entidades com as quais vamos trabalhar.
Por fim, serão expostas as conclusões resultantes da pesquisa e análise do tema.



2. REGIME JURÍDICO


O termo “regime” conforme o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (2006) significa “Regimento”, “Modo de viver, ou de exercer ou organizar certas atividades”, “conjunto de normas que regem o funcionamento de uma instituição”. Entenda-se o termo normas na acepção feita por Dworkin, citado por BONFIM (2006), isto é, gênero do qual fazem parte os princípios e as regras. Os primeiros aplicados como otimizadores do Direito, verdadeiros instrumentos de oxigenação e sustentação para todo o ordenamento jurídico. E as segundas, como mandamentos legais aplicados sob a forma do “all or nothing”, num modelo subsuntivo de adequação dos fatos ao disposto no termo legal.
Dito isto, podemos afirmar que regime jurídico é o conjunto de normas jurídicas que regem o funcionamento de uma instituição e pelo qual todos os seus atos terão que pautar-se.
Os regimes centrais que a doutrina nos aponta são o de Direito Público, o de Direito Privado, e um regime denominado Híbrido.
O regime de Direito Público consiste em caracterizar determinados interesses como relevantes e concernentes à esfera social, e não aos particulares, se considerados enquanto indivíduos singulares que perseguem fins em proveito próprio apenas, esclarece o Professor Celso Antônio Bandeira de Mello (2007).
Nestes termos, o Regime de Direito Público tem fundamento na consagração do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o privado, Princípio da indisponibilidade do Interesse Público, Legalidade, Impessoalidade, Continuidade, Publicidade, Moralidade, Razoabilidade, Proporcionalidade, entre outros.
Destes, merecem destaque os dois primeiros, verdadeiros pilares que são do Direito Público. Assim, a prevalência do Interesse Público sobre o Privado, erigido em princípio sede e condição de sobrevivência da sociedade em geral, e dos próprios indivíduos particularmente. Em se falando de conseqüências administrativas deste regime veremos que graças a ele as pessoas (Estado, Entidades administrativas) e órgãos que cuidam do interesse coletivo gozam de prerrogativas instrumentadoras de sua ação. Protegem assim as finalidades públicas instituídas pela ordem jurídica. Exemplos disso são os prazos maiores em processos judiciais, a presunção de veracidade e legitimidade dos atos públicos, etc. Também é decorrência deste princípio a verticalidade nas relações do Estado com os particulares. O regime jurídico de Direito Público é, em síntese o regime jurídico-administrativo, pelo qual o Estado se organiza e age em prol da população.
A Indisponibilidade do Interesses Públicos pela Administração, que deve obedecer às finalidades públicas, e não comportar-se como proprietária deles, dispondo ao seu bel prazer de interesses que pertencem a toda sociedade, pois, por definição, Administração opõe-se à Propriedade, como já dizia Cirne Lima, citado por MELLO (2007, p. 70). Por isso é que se submete à restrições também, como a obrigatoriedade de concursos para o preenchimento de seus cargos, e de licitação para as contratações entre outras.
Por outro lado, o Regime de Direito Privado pauta-se pelo Princípio da Liberdade, segundo o qual, exceto o proibido por lei, tudo é permitido. Além disso, volta-se para interesses individuais, pessoais, pela busca de lucro quando se atue na esfera financeira, etc. Em contraposição à Indisponibilidade de Bens e Interesses vigora a total disponibilidade, movida pela vontade particular.
Neste contexto, Maria Sylvia Zanella di Pietro (2005) destaca alguns traços distintivos entre as “pessoas públicas” e “pessoas privadas”. De acordo com a ilustrada jurista, aquelas distinguem-se por originar-se da vontade estatal, não ter fins lucrativos, mas sim de interesse coletivo, não podem ser extintas por vontade própria, sujeitam-se ao “controle positivo” do Estado, gozam de algumas prerrogativas de autoridade e não são livres para fixar ou modificar os próprios fins e obrigações. As pessoas privadas, por seu escopo, originam – se da vontade particular, geralmente tem fins lucrativos, obedecem às finalidades do interesse particular; não dispõem de prerrogativas autoritárias, possuem liberdade para se extinguir, modificar ou prosseguir com os fins a que se destina, além de sujeitar-se ao poder de polícia e “controle negativo” do Estado.
Já o regime Híbrido, que será objeto de explanação mais atenta no quarto tópico deste trabalho configura um misto do regime jurídico – administrativo com características de regime jurídico de direito privado.

3. ADMINISTRAÇÃO INDIRETA


A Administração Pública ao descentralizar-se administrativamente subdivide-se, conforme o art. 4º do Decreto-lei nº 200 em Direta e Indireta. A Direta consiste nos serviços que se integram à estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. Enquanto que a Indireta, na acepção legislativa atual, compreende as Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Fundações.
As autarquias, conforme Celso Antônio Bandeira de Mello “são pessoas jurídicas de direito público de capacidade exclusivamente administrativa”, logo, o regime a que se submetem é o Público.
As Fundações constituem em pessoas jurídicas formadas pela destinação patrimonial a um fim lícito determinado. Sua natureza jurídica suscita calorosas discussões na doutrina, que oscila entre admitir sua natureza jurídica de Direito Privado, Direito Público, ou atribuir-lhe qualquer das duas naturezas, atinando ao critério da finalidade a que se destinem, quando de sua instituição pelo Estado. Em que pese não ser este o objeto do presente trabalho, será adotada aqui a concepção, majoritária na doutrina, da Professora Maria Sylvia Di Pietro, segundo a qual o Poder Público pode instituir Fundações de Direito Público e Fundações de Direito Privado.
A Empresa Pública é a pessoa jurídica de direito privado constituída por capital unicamente público para a consecução de atividade de natureza econômica. Podem ser prestadoras de serviços públicos ou exploradoras da atividade econômica.
E as Sociedades de Economia mista são as pessoas jurídicas de direito privado constituída por capital e capital privado voltada, também, à consecução de atividade de natureza econômica.
Visto que está pacificada a natureza jurídica e regime que se aplica às Autarquias, leia-se, de Direito Público, o grande questionamento recai sobre o regime jurídico que vigora nas Fundações Públicas de Direito Privado, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista, se estas tem natureza de direito privado, embora sejam instrumentos criados para o Estado para atingir suas finalidades. À análise deste questionamento passaremos agora.

4. REGIME APLICADO ÀS ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA


Conforme o já explicitado é pacífico o regime aplicado às Autarquias e Fundações Públicas de Direito Público, qual seja: o regime jurídico de Direito Público.
Quanto às demais entidades, parcela da doutrina afirma, com base na literalidade de alguns dispositivos da Constituição Federal de 1988, que se guiam pelo regime de Direito Privado, com todas as características dele inseparáveis. Os supracitados dispositivos são os seguintes:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
..............................................................................................................................................
IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários;
.............................................................................................................................................. § 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.

Assim, conforme aqueles que defendem o regime de Direito Privado destas entidades, elas obedecem ao regime privado por explorar a atividade econômica, atividade só permitida em casos especialíssimos. Além de igualizar as Empresas Estatais às do setor privado quanto a benefícios fiscais.
Entretanto, qualquer leitura do texto Constitucional não pode ser feita isoladamente, sob pena de resultar em equívocos e falsos entendimentos da mens legis. Em verdade há que se obedecer ao Princípio da Unidade da Constituição, verdadeiro pilar hermenêutico, segundo o qual os dispositivos constitucionais se interpenetram e mutuamente se influenciam harmonicamente.
Assim, a única finalidade na vedação a privilégios fiscais para as empresas estatais de que não gozem também as empresas privadas, é evitar um desleal concorrência.
No mais, uma série de outros dispositivos, colacionados por Celso Antônio Bandeira de Mello, completam e esclarecem as características das empresas estatais. São eles:
Art. 5º ...................................................................................................................................
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;

Saliente-se do supramencionado o trecho “ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe”.
Também o art. 14, § 9º, determina que Lei complementar estabelecerá casos de inelegibilidade, assim como os prazos de cessação, com a finalidade de proteção devida à probidade administrativa, moralidade, normalidade e legitimidade das eleições “contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
O art. 37, por sua vez submete tanto a Administração Direta como a Indireta aos princípios da moralidade, eficiência, legalidade, impessoalidade e publicidade, bem como em seus incisos estatui a necessidade de concurso público tanto para as entidades da Administração Indireta quanto para a Direta e Autárquica, mantém para todas a proibição de acumular cargos públicos e a obrigação de licitação pública na contratação de obras, serviços, alienações e compras.
Determina, também o art. 48 a competência do Congresso Nacional para fiscalizar e controlar diretamente os atos do Poder executivo, aí incluídos os atos da Administração Pública.
O art. 52, por seu turno estabelece a competência do Senado Federal para “VII - dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal”.
O art. 54 da CF/88 por outra banda, prevê o impedimento de deputados e senadores, desde a diplomação, de firmarem ou manterem contrato com pessoa jurídica de direito público, Empresa Pública ou Sociedade de Economia Mista, salvo a exceção do contrato estabelecer cláusulas uniformes. Também não poderão nelas exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os que prevejam demissão “ad nutum”. A violação a este impedimento é causa de perda do cargo de deputado ou senador.
O art. 70, tratando do controle interno dos poderes e do Congresso Nacional estabelece que exercerão a fiscalização nos níveis contábeis, financeiro, orçamentário e patrimonial tanto da União quanto das entidades da administração direta e indireta, quanto aos critérios da legalidade, economicidade e legitimidade. Estatui também a fiscalização sobre a “aplicação de subvenções e renúncias de receitas” para tais entidades.
O art. 71 destina ao Tribunal de Contas, enquanto fiscalizador externo, a tarefa de “julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por bens ou valores públicos da administração direta e indireta [...]”, julgar também as admissões de pessoal na administração direta e indireta e realizar nelas inspeções ou auditorias, por iniciativa própria, ou de qualquer das casas do Congresso Nacional, ou de Comissão técnica ou de inquérito.
O art. 163, II, traz em seu bojo a previsão de lei complementar que irá dispor sobre a dívida pública interna e externa tanto das autarquias e fundações quanto das demais entidades controladas pelo Poder Público.
O art. 165, § 5º ao tratar da lei orçamentária dispõe: “III - o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público”.
Os dispositivos acima elencados são também obrigatórios para os Estados e Municípios e denotam claramente que as Entidades da Administração Indireta tem disciplina muito diversa daquele das empresas privadas, sejam exploradoras de atividade econômica ou prestadoras de serviço público, tenham ou não capital parcialmente privado.
É inarredável dizer que a fórmula utilizada pelo Estado para dar forma às suas criaturas é mero instrumental para concretizar os fins coletivos que tem por dever tornar efetivos. Nas palavras de MELLO (2007, p. 1) “não passam de sujeitos auxiliares seus”, controlados pelo Estado, o que prova mais uma vez a diferença essencial que há entre tais entes e as entidades privadas, que, conforme foi visto anteriormente, não se subsumem ao controle Estatal.
As normas constitucionais citadas só levam à conclusão de que, mesmo tendo o vestuário de Direito Privado, sua essência é de Direito Público, visto que são interesses, recursos, e fins públicos de que se utilizam e aos quais se destinam. Além disso, conforme MELLO (Natureza essencial das Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas, in Revista de Direito Público, vol. 71, p. 115, citado em MELLO, 2007, p. 3):
o grau de funcionalidade da distinção entre pessoa de direito público e pessoa de direito privado – questão que se resume a uma discriminação de regimes – cai para seu nível mínimo. Embora sem apagar a distinção existente, reduz-se a teores modestos, dada a vigorosa concorrência de princípios e normas publicísticas inevitavelmente afluentes para a proteção da atividade desempenhada, controle da ação de seus agentes e defesa dos administrados. Assim, a personalidade de direito privado que lhes seja infundida , é matizada por vivos tons de direito público , a fim de se ajustar a suas funções.

Disto percebe-se que as Empresas Estatais prestadoras de serviços não diferem, em seu regime do regime de Direito Público. Já as exploradoras de atividades econômicas, se diferenciarão um pouco, aproximando-se de alguns institutos privados para que tenha melhor desempenho e desenvoltura, afastando-se das prerrogativas de Direito Público, porque estas não se fazem necessárias para a execução de sua atividade, ou mesmo, porque em alguns configuraria uma concorrência desleal com o setor privado. Enfim, mesmo com natureza de Direito Privado seus interesses superam o privatismo, mesclando os dois regimes. É o chamado Regime Híbrido, termo usado primordialmente por Jean –Denis Bredin em trabalho monográfico datado de 1957.
No direito positivo brasileiro Helly Lopes Meirelles foi um dos primeiros a defender este regime híbrido.
O regime híbrido, portanto, caracteriza-se pela variação em intensidade e predominância de um dos regimes, público ou privado, conforme a finalidade do ente instituído.

5. CONCLUSÕES


O presente trabalho tratou do Regime Jurídico das Entidades da Administração Indireta. Não tendo sido a intenção esgotar tema tão rico e importante para o Direito Administrativo, as principais conclusões a que se chegou foram as seguintes:
1. Regime jurídico é o conjunto de normas jurídicas que regem o funcionamento de uma instituição e pelo qual todos os seus atos terão que pautar-se;
2. O Regime de Direito Público tem fundamento na consagração do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o privado, Princípio da indisponibilidade do Interesse Público, Legalidade, Impessoalidade, Continuidade, Publicidade, Moralidade, Razoabilidade, Proporcionalidade, entre outros.
3. O Regime de Direito Privado tem por fundamento o Princípio da Liberdade, segundo o qual, exceto o proibido por lei, tudo é permitido. Além disso, volta-se para interesses individuais, pessoais, pela busca de lucro quando se atue na esfera financeira, etc. Em contraposição à Indisponibilidade de Bens e Interesses vigora a total disponibilidade, movida pela vontade particular.
4. As pessoas de direito público distinguem-se das demais por originar-se da vontade estatal, não ter fins lucrativos, mas sim de interesse coletivo, não podem ser extintas por vontade própria, sujeitam-se ao “controle positivo” do Estado, gozam de algumas prerrogativas de autoridade e não são livres para fixar ou modificar os próprios fins e obrigações. As pessoas privadas, por seu escopo, originam – se da vontade particular, geralmente tem fins lucrativos, obedecem às finalidades do interesse particular; não dispõem de prerrogativas autoritárias, possuem liberdade para se extiguir, modificar ou prosseguir com os fins a que se destina, além de sujeitar-se ao poder de polícia e “controle negativo” do Estado.
5. Vários são os dispositivos constitucionais que explicitam a influência de normas publicísticas nos Entes da Administração Indireta, entre eles, o art. 5º, LXXIII; art. 14, § 9º; art. 37; art. 48, art.; art. 52, VII; art. 54; art. 70; art. 71; art. 163, II; 165, § 5º, III, entre outros;
6. As normas constitucionais citadas só levam à conclusão de que, mesmo tendo o vestuário de Direito Privado, sua essência é de Direito Público, visto que são interesses, recursos, e fins públicos de que se utilizam e aos quais se destinam.
7. O regime híbrido, portanto, caracteriza-se pela variação em intensidade e predominância de um dos regimes, público ou privado, conforme a finalidade do ente instituído.


6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BONFIM, Thiago Rodrigues de Pontes. Os Princípios Constitucionais e o Condicionamento da Interpretação da Constituição. Revista do Mestrado em Direito, - v. 2, n 2, jun (2006 - ). – Maceió: Nossa Livraria, 2006 -.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

CIRNE LIMA, Rui. Princípios de Direito Administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1954. Em MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2005.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio: o dicionário da Língua Portuguesa. Coord. Margarida dos Anjos, Marina Baiard Ferreira. 6. ed. Curitiba: Positivo, 2006.

MEIRELLES, Helly Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2005.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007.

__________. Sociedades Mistas, Empresas Públicas e o Regime de Direito Público. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico(REDAE). Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 10, maio/ junho/ julho, 2007. Disponível na internet :http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE. asp. Acesso em: 14 nov. 2007.