quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Revisão nos contratos administrativos

Por se falar em contratos, em todos os ramos do direito, mister falar-se na teoria da imutabilidade das cláusulas contratuais.
Representada pela expressão latina pacta sunt servanda, encontra significado na máxima “o contrato faz lei entre as partes”. Unindo ação às palavras, os contratos seriam imutáveis, ainda que por justa razão superveniente – não alterados, não revisados: cumpridos.
O princípio da força obrigatória, entretanto, encontra oposição no algo neófito rebus sic stantibus, isto é, a teoria da imprevisão, que visa diretamente a igualdade entre as partes.
Zunino Neto ensina que antes da promulgação da Constituição vigente, a doutrina estabelecera a nulidade ou resolução do contrato como soluções para qualquer falha insanável que impedisse seu cumprimento (tal como o não preenchimento dos requisitos essenciais para contratação).
Entrementes, a nova legislação, a exemplo do Código de Defesa do Consumidor, bem como a jurisprudência em peso, tem identificado na revisão instituto mantenedor da legalidade e do bem comum.
Também o direito administrativo acha baliza nos brocardos da imutabilidade e da imprevisão. É correto afirmar, portanto, que os contratos administrativos devem ser cumpridos, exceto em caso de desequilíbrio entre as partes contratantes. Quando dessas ocorrências, é cabível a revisão do contrato.
A revisão, assim, acha-se intrinsecamente relacionada ao equilíbrio econômico-financeiro das partes, repetidamente referido como “equação econômico-financeira”. Kléber Martins de Araújo a conceitua como permanente equivalência entre os encargos suportados pelo particular e a remuneração a ele paga pela Administração.

Ora, estando o particular cumprindo seu encargo contratual, bem como a Administração honrado com a respectiva remuneração, e não havendo disparidade entre as respectivas obrigações (encargo-remuneração), conclui-se que as partes encontram-se nas mesmas condições de quando da celebração do pacto, não lhes assistindo, portanto, quaisquer justificações plausíveis para tentar se esquivar do cumprimento de suas cláusulas, por mero capricho ou motivo irrelevante, senão por eventos que tornassem o negócio demasiadamente oneroso para qualquer deles, ou nos casos de alteração unilateral do contrato pela Administração em virtude do princípio da supremacia do interesse público.

O citado equilíbrio tem esteio na própria Constituição Federal, art. 37, inciso XXI, que traz o seguinte texto:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:[...]
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.


Em semelhante redação, o chamado Estatuto da Licitação, Lei nº 8.666/93 preleciona:

Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:[...]
II - por acordo das partes:
[...] d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando área econômica extraordinária e extracontratual

Novamente, a revisão surge nesse contexto como forma de relativizar o princípio da força obrigatória. Outras formas de relativização restam nas denominadas correção monetária e reajuste – este último previsto no contrato, por ser devido a fatores previsíveis que requeiram alteração de valores. A revisão aparece, outrossim, como o único meio flexibilizador do pacta sunt servanda que se baseia no rebus sic stantibus.
Exemplo prático para o recurso em tela se dá com a atualização das alíquotas da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social - COFINS sobre o contrato ajustado, causando prejuízo para a parte.
Em síntese, o contrato administrativo não pode ser tido como intangível ou imutável, a menos que com isso se queira apontar uma regra sem abarcar suas exceções. A revisão é uma delas, na sua qualidade de instituto relativizador do princípio pacta sunt servanda.
Essa relativização só é possível através da teoria da imprevisão, que permite que fatos ulteriores imprevistos e imprevisíveis acarretem a revisão e possível alteração ou resolução do contrato, a fim de que seja preservado o equilíbrio entre os contratantes, no que tange a suas condições econômicas e financeiras. A preocupação com a conservação da equação mencionada provém mesmo de disciplina do legislador, como manda o princípio da legalidade na Administração, e de crescente interesse da doutrina.
Destarte, revisão em contrato administrativo é possível e cabível nos termos examinados, com a finalidade última de proteger a justeza do contrato e o interesse público.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Kleber Martins de. Contratos administrativos: cláusulas de reajuste de preços e reajustes e índices oficiais . Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: . Acesso em: 27 out. 2008.

Boletim Informativo de Licitação da Procuradoria Geral do Município - nº 18 - Junho. São Paulo, 2004. Disponível em: http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/negocios_juridicos/licitacoes_boletins/0018. Acesso em 27.0ut.2008.

ZUNINO NETO, Nelson. Pacta sunt servanda x rebus sic stantibus: uma breve abordagem. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 31, maio 1999. Disponível em: . Acesso em: 28 out. 2008.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Considerações sobre o Regime Jurídico das Entidades da Administração Indireta

1. INTRODUÇÃO


O trabalho que será delineado visa lançar algumas luzes sobre o tema do Regime Jurídico das Entidades da Administração Indireta, tema complexo que suscitará a análise dos Regimes de Direito Público e de Direito Privado.
Num primeiro momento será apresentada uma introdução ao tema do regime jurídico, explicando sua definição e explicitando os que existem com as peculiaridades que lhes são inerentes.
Depois, trataremos de expor quais entidades compõem a Administração Indireta, seu conceito e breves características, o que nos fornecerá subsídios para analisar o regime jurídico que adotam.
Superada esta etapa partiremos para o tema central do trabalho fazendo as considerações pertinentes ao Regime Jurídico das entidades com as quais vamos trabalhar.
Por fim, serão expostas as conclusões resultantes da pesquisa e análise do tema.



2. REGIME JURÍDICO


O termo “regime” conforme o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (2006) significa “Regimento”, “Modo de viver, ou de exercer ou organizar certas atividades”, “conjunto de normas que regem o funcionamento de uma instituição”. Entenda-se o termo normas na acepção feita por Dworkin, citado por BONFIM (2006), isto é, gênero do qual fazem parte os princípios e as regras. Os primeiros aplicados como otimizadores do Direito, verdadeiros instrumentos de oxigenação e sustentação para todo o ordenamento jurídico. E as segundas, como mandamentos legais aplicados sob a forma do “all or nothing”, num modelo subsuntivo de adequação dos fatos ao disposto no termo legal.
Dito isto, podemos afirmar que regime jurídico é o conjunto de normas jurídicas que regem o funcionamento de uma instituição e pelo qual todos os seus atos terão que pautar-se.
Os regimes centrais que a doutrina nos aponta são o de Direito Público, o de Direito Privado, e um regime denominado Híbrido.
O regime de Direito Público consiste em caracterizar determinados interesses como relevantes e concernentes à esfera social, e não aos particulares, se considerados enquanto indivíduos singulares que perseguem fins em proveito próprio apenas, esclarece o Professor Celso Antônio Bandeira de Mello (2007).
Nestes termos, o Regime de Direito Público tem fundamento na consagração do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o privado, Princípio da indisponibilidade do Interesse Público, Legalidade, Impessoalidade, Continuidade, Publicidade, Moralidade, Razoabilidade, Proporcionalidade, entre outros.
Destes, merecem destaque os dois primeiros, verdadeiros pilares que são do Direito Público. Assim, a prevalência do Interesse Público sobre o Privado, erigido em princípio sede e condição de sobrevivência da sociedade em geral, e dos próprios indivíduos particularmente. Em se falando de conseqüências administrativas deste regime veremos que graças a ele as pessoas (Estado, Entidades administrativas) e órgãos que cuidam do interesse coletivo gozam de prerrogativas instrumentadoras de sua ação. Protegem assim as finalidades públicas instituídas pela ordem jurídica. Exemplos disso são os prazos maiores em processos judiciais, a presunção de veracidade e legitimidade dos atos públicos, etc. Também é decorrência deste princípio a verticalidade nas relações do Estado com os particulares. O regime jurídico de Direito Público é, em síntese o regime jurídico-administrativo, pelo qual o Estado se organiza e age em prol da população.
A Indisponibilidade do Interesses Públicos pela Administração, que deve obedecer às finalidades públicas, e não comportar-se como proprietária deles, dispondo ao seu bel prazer de interesses que pertencem a toda sociedade, pois, por definição, Administração opõe-se à Propriedade, como já dizia Cirne Lima, citado por MELLO (2007, p. 70). Por isso é que se submete à restrições também, como a obrigatoriedade de concursos para o preenchimento de seus cargos, e de licitação para as contratações entre outras.
Por outro lado, o Regime de Direito Privado pauta-se pelo Princípio da Liberdade, segundo o qual, exceto o proibido por lei, tudo é permitido. Além disso, volta-se para interesses individuais, pessoais, pela busca de lucro quando se atue na esfera financeira, etc. Em contraposição à Indisponibilidade de Bens e Interesses vigora a total disponibilidade, movida pela vontade particular.
Neste contexto, Maria Sylvia Zanella di Pietro (2005) destaca alguns traços distintivos entre as “pessoas públicas” e “pessoas privadas”. De acordo com a ilustrada jurista, aquelas distinguem-se por originar-se da vontade estatal, não ter fins lucrativos, mas sim de interesse coletivo, não podem ser extintas por vontade própria, sujeitam-se ao “controle positivo” do Estado, gozam de algumas prerrogativas de autoridade e não são livres para fixar ou modificar os próprios fins e obrigações. As pessoas privadas, por seu escopo, originam – se da vontade particular, geralmente tem fins lucrativos, obedecem às finalidades do interesse particular; não dispõem de prerrogativas autoritárias, possuem liberdade para se extinguir, modificar ou prosseguir com os fins a que se destina, além de sujeitar-se ao poder de polícia e “controle negativo” do Estado.
Já o regime Híbrido, que será objeto de explanação mais atenta no quarto tópico deste trabalho configura um misto do regime jurídico – administrativo com características de regime jurídico de direito privado.

3. ADMINISTRAÇÃO INDIRETA


A Administração Pública ao descentralizar-se administrativamente subdivide-se, conforme o art. 4º do Decreto-lei nº 200 em Direta e Indireta. A Direta consiste nos serviços que se integram à estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. Enquanto que a Indireta, na acepção legislativa atual, compreende as Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Fundações.
As autarquias, conforme Celso Antônio Bandeira de Mello “são pessoas jurídicas de direito público de capacidade exclusivamente administrativa”, logo, o regime a que se submetem é o Público.
As Fundações constituem em pessoas jurídicas formadas pela destinação patrimonial a um fim lícito determinado. Sua natureza jurídica suscita calorosas discussões na doutrina, que oscila entre admitir sua natureza jurídica de Direito Privado, Direito Público, ou atribuir-lhe qualquer das duas naturezas, atinando ao critério da finalidade a que se destinem, quando de sua instituição pelo Estado. Em que pese não ser este o objeto do presente trabalho, será adotada aqui a concepção, majoritária na doutrina, da Professora Maria Sylvia Di Pietro, segundo a qual o Poder Público pode instituir Fundações de Direito Público e Fundações de Direito Privado.
A Empresa Pública é a pessoa jurídica de direito privado constituída por capital unicamente público para a consecução de atividade de natureza econômica. Podem ser prestadoras de serviços públicos ou exploradoras da atividade econômica.
E as Sociedades de Economia mista são as pessoas jurídicas de direito privado constituída por capital e capital privado voltada, também, à consecução de atividade de natureza econômica.
Visto que está pacificada a natureza jurídica e regime que se aplica às Autarquias, leia-se, de Direito Público, o grande questionamento recai sobre o regime jurídico que vigora nas Fundações Públicas de Direito Privado, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista, se estas tem natureza de direito privado, embora sejam instrumentos criados para o Estado para atingir suas finalidades. À análise deste questionamento passaremos agora.

4. REGIME APLICADO ÀS ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA


Conforme o já explicitado é pacífico o regime aplicado às Autarquias e Fundações Públicas de Direito Público, qual seja: o regime jurídico de Direito Público.
Quanto às demais entidades, parcela da doutrina afirma, com base na literalidade de alguns dispositivos da Constituição Federal de 1988, que se guiam pelo regime de Direito Privado, com todas as características dele inseparáveis. Os supracitados dispositivos são os seguintes:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
..............................................................................................................................................
IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários;
.............................................................................................................................................. § 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.

Assim, conforme aqueles que defendem o regime de Direito Privado destas entidades, elas obedecem ao regime privado por explorar a atividade econômica, atividade só permitida em casos especialíssimos. Além de igualizar as Empresas Estatais às do setor privado quanto a benefícios fiscais.
Entretanto, qualquer leitura do texto Constitucional não pode ser feita isoladamente, sob pena de resultar em equívocos e falsos entendimentos da mens legis. Em verdade há que se obedecer ao Princípio da Unidade da Constituição, verdadeiro pilar hermenêutico, segundo o qual os dispositivos constitucionais se interpenetram e mutuamente se influenciam harmonicamente.
Assim, a única finalidade na vedação a privilégios fiscais para as empresas estatais de que não gozem também as empresas privadas, é evitar um desleal concorrência.
No mais, uma série de outros dispositivos, colacionados por Celso Antônio Bandeira de Mello, completam e esclarecem as características das empresas estatais. São eles:
Art. 5º ...................................................................................................................................
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;

Saliente-se do supramencionado o trecho “ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe”.
Também o art. 14, § 9º, determina que Lei complementar estabelecerá casos de inelegibilidade, assim como os prazos de cessação, com a finalidade de proteção devida à probidade administrativa, moralidade, normalidade e legitimidade das eleições “contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
O art. 37, por sua vez submete tanto a Administração Direta como a Indireta aos princípios da moralidade, eficiência, legalidade, impessoalidade e publicidade, bem como em seus incisos estatui a necessidade de concurso público tanto para as entidades da Administração Indireta quanto para a Direta e Autárquica, mantém para todas a proibição de acumular cargos públicos e a obrigação de licitação pública na contratação de obras, serviços, alienações e compras.
Determina, também o art. 48 a competência do Congresso Nacional para fiscalizar e controlar diretamente os atos do Poder executivo, aí incluídos os atos da Administração Pública.
O art. 52, por seu turno estabelece a competência do Senado Federal para “VII - dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal”.
O art. 54 da CF/88 por outra banda, prevê o impedimento de deputados e senadores, desde a diplomação, de firmarem ou manterem contrato com pessoa jurídica de direito público, Empresa Pública ou Sociedade de Economia Mista, salvo a exceção do contrato estabelecer cláusulas uniformes. Também não poderão nelas exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os que prevejam demissão “ad nutum”. A violação a este impedimento é causa de perda do cargo de deputado ou senador.
O art. 70, tratando do controle interno dos poderes e do Congresso Nacional estabelece que exercerão a fiscalização nos níveis contábeis, financeiro, orçamentário e patrimonial tanto da União quanto das entidades da administração direta e indireta, quanto aos critérios da legalidade, economicidade e legitimidade. Estatui também a fiscalização sobre a “aplicação de subvenções e renúncias de receitas” para tais entidades.
O art. 71 destina ao Tribunal de Contas, enquanto fiscalizador externo, a tarefa de “julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por bens ou valores públicos da administração direta e indireta [...]”, julgar também as admissões de pessoal na administração direta e indireta e realizar nelas inspeções ou auditorias, por iniciativa própria, ou de qualquer das casas do Congresso Nacional, ou de Comissão técnica ou de inquérito.
O art. 163, II, traz em seu bojo a previsão de lei complementar que irá dispor sobre a dívida pública interna e externa tanto das autarquias e fundações quanto das demais entidades controladas pelo Poder Público.
O art. 165, § 5º ao tratar da lei orçamentária dispõe: “III - o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público”.
Os dispositivos acima elencados são também obrigatórios para os Estados e Municípios e denotam claramente que as Entidades da Administração Indireta tem disciplina muito diversa daquele das empresas privadas, sejam exploradoras de atividade econômica ou prestadoras de serviço público, tenham ou não capital parcialmente privado.
É inarredável dizer que a fórmula utilizada pelo Estado para dar forma às suas criaturas é mero instrumental para concretizar os fins coletivos que tem por dever tornar efetivos. Nas palavras de MELLO (2007, p. 1) “não passam de sujeitos auxiliares seus”, controlados pelo Estado, o que prova mais uma vez a diferença essencial que há entre tais entes e as entidades privadas, que, conforme foi visto anteriormente, não se subsumem ao controle Estatal.
As normas constitucionais citadas só levam à conclusão de que, mesmo tendo o vestuário de Direito Privado, sua essência é de Direito Público, visto que são interesses, recursos, e fins públicos de que se utilizam e aos quais se destinam. Além disso, conforme MELLO (Natureza essencial das Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas, in Revista de Direito Público, vol. 71, p. 115, citado em MELLO, 2007, p. 3):
o grau de funcionalidade da distinção entre pessoa de direito público e pessoa de direito privado – questão que se resume a uma discriminação de regimes – cai para seu nível mínimo. Embora sem apagar a distinção existente, reduz-se a teores modestos, dada a vigorosa concorrência de princípios e normas publicísticas inevitavelmente afluentes para a proteção da atividade desempenhada, controle da ação de seus agentes e defesa dos administrados. Assim, a personalidade de direito privado que lhes seja infundida , é matizada por vivos tons de direito público , a fim de se ajustar a suas funções.

Disto percebe-se que as Empresas Estatais prestadoras de serviços não diferem, em seu regime do regime de Direito Público. Já as exploradoras de atividades econômicas, se diferenciarão um pouco, aproximando-se de alguns institutos privados para que tenha melhor desempenho e desenvoltura, afastando-se das prerrogativas de Direito Público, porque estas não se fazem necessárias para a execução de sua atividade, ou mesmo, porque em alguns configuraria uma concorrência desleal com o setor privado. Enfim, mesmo com natureza de Direito Privado seus interesses superam o privatismo, mesclando os dois regimes. É o chamado Regime Híbrido, termo usado primordialmente por Jean –Denis Bredin em trabalho monográfico datado de 1957.
No direito positivo brasileiro Helly Lopes Meirelles foi um dos primeiros a defender este regime híbrido.
O regime híbrido, portanto, caracteriza-se pela variação em intensidade e predominância de um dos regimes, público ou privado, conforme a finalidade do ente instituído.

5. CONCLUSÕES


O presente trabalho tratou do Regime Jurídico das Entidades da Administração Indireta. Não tendo sido a intenção esgotar tema tão rico e importante para o Direito Administrativo, as principais conclusões a que se chegou foram as seguintes:
1. Regime jurídico é o conjunto de normas jurídicas que regem o funcionamento de uma instituição e pelo qual todos os seus atos terão que pautar-se;
2. O Regime de Direito Público tem fundamento na consagração do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o privado, Princípio da indisponibilidade do Interesse Público, Legalidade, Impessoalidade, Continuidade, Publicidade, Moralidade, Razoabilidade, Proporcionalidade, entre outros.
3. O Regime de Direito Privado tem por fundamento o Princípio da Liberdade, segundo o qual, exceto o proibido por lei, tudo é permitido. Além disso, volta-se para interesses individuais, pessoais, pela busca de lucro quando se atue na esfera financeira, etc. Em contraposição à Indisponibilidade de Bens e Interesses vigora a total disponibilidade, movida pela vontade particular.
4. As pessoas de direito público distinguem-se das demais por originar-se da vontade estatal, não ter fins lucrativos, mas sim de interesse coletivo, não podem ser extintas por vontade própria, sujeitam-se ao “controle positivo” do Estado, gozam de algumas prerrogativas de autoridade e não são livres para fixar ou modificar os próprios fins e obrigações. As pessoas privadas, por seu escopo, originam – se da vontade particular, geralmente tem fins lucrativos, obedecem às finalidades do interesse particular; não dispõem de prerrogativas autoritárias, possuem liberdade para se extiguir, modificar ou prosseguir com os fins a que se destina, além de sujeitar-se ao poder de polícia e “controle negativo” do Estado.
5. Vários são os dispositivos constitucionais que explicitam a influência de normas publicísticas nos Entes da Administração Indireta, entre eles, o art. 5º, LXXIII; art. 14, § 9º; art. 37; art. 48, art.; art. 52, VII; art. 54; art. 70; art. 71; art. 163, II; 165, § 5º, III, entre outros;
6. As normas constitucionais citadas só levam à conclusão de que, mesmo tendo o vestuário de Direito Privado, sua essência é de Direito Público, visto que são interesses, recursos, e fins públicos de que se utilizam e aos quais se destinam.
7. O regime híbrido, portanto, caracteriza-se pela variação em intensidade e predominância de um dos regimes, público ou privado, conforme a finalidade do ente instituído.


6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BONFIM, Thiago Rodrigues de Pontes. Os Princípios Constitucionais e o Condicionamento da Interpretação da Constituição. Revista do Mestrado em Direito, - v. 2, n 2, jun (2006 - ). – Maceió: Nossa Livraria, 2006 -.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

CIRNE LIMA, Rui. Princípios de Direito Administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1954. Em MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2005.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio: o dicionário da Língua Portuguesa. Coord. Margarida dos Anjos, Marina Baiard Ferreira. 6. ed. Curitiba: Positivo, 2006.

MEIRELLES, Helly Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2005.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007.

__________. Sociedades Mistas, Empresas Públicas e o Regime de Direito Público. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico(REDAE). Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 10, maio/ junho/ julho, 2007. Disponível na internet :http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE. asp. Acesso em: 14 nov. 2007.

sábado, 29 de novembro de 2008

FURTO EM ESTABELECIMENTO VIGIADO POR CÂMERAS: Tentativa ou Crime Impossível?


A tentativa consiste na realização inconclusa da conduta típica. Conforme Zaffaroni, tem natureza jurídica de “ampliação da tipicidade proibida” que abrange a conduta “imediatamente anterior à consumação”. Entretanto, há opiniões doutrinárias divergentes, pois Aníbal Bruno a considera delito imperfeito ou frustrado; Roberto D’Avila entende que se trata de regra de extensão da pena e David Teixeira de Azevedo a considera delito autônomo, com estrutura completa, objetiva e subjetivamente.

No que concerne às teorias fundamentadoras da punição da tentativa, a doutrina elenca quatro principais: 1) a subjetiva, que leva em consideração apenas o valor da ação, não tendo relevância o desvalor do resultado, visando punir o agente que manifesta vontade contrária ao Direito. Assim, o agente pode ser punido a partir do momento em que ingressa na fase de preparação; 2) a objetiva, que considera tanto o desvalor da ação quanto o desvalor do resultado. É a adotada pelo art. 17 do CP brasileiro vigente; 3) a subjetivo-objetiva, pela qual se pune em razão do risco causado ao bem jurídico protegido; e 4) a sintomática, para a qual o fundamento da punição é a prevenção.

Por outro lado, existe a tentativa não punível, mais conhecida como crime impossível, na qual o agente usa meios absolutamente ineficazes ou o objeto que visa atingir é absolutamente impróprio. Trata-se de causa excludente da tipicidade, pois o bem jurídico não sofre risco algum, logo não há punição.

No que tange especificamente à consumação do crime de furto, MIRABETE elenca as seguintes teorias:


[...] (1) a concretatio (basta tocar a coisa); (2) a apprehensio rei (é suficiente segurá-la); (3) a amotio (exige-se a remoção de lugar); e (4) a ablatio (a coisa é colocada no local a que se destinava, em segurança). A jurisprudência consagrou uma situação intermediária entre as duas últimas teorias, a da inversão da posse [...] (2007, p. 206-207).


Assim, os tribunais superiores consagraram que se reputa consumado o crime de furto quando, havendo a inversão da posse, o agente a detém de forma tranqüila, mesmo que por pouco tempo.
Em relação ao caso em que a conduta do agente é previamente vigiada por câmeras de segurança, há teorias controversas na doutrina.

Aqueles que adotam a teoria subjetiva entendem haver tentativa, haja vista que para esta basta a vontade – contrária ao Direito – de subtrair coisa alheia móvel, aliada ao animus furandi. Logo, trata-se de tentativa.

Para Jescheck, entretanto, como o Código Penal brasileiro em vigor adota a teoria objetiva, a tentativa só é punida por haver grande probabilidade da produção do ilícito. Logo, a tentativa absolutamente inidônea simplesmente afasta a punibilidade. Portanto, como a ação do indivíduo que esconde um objeto de estabelecimento vigiado por câmeras de segurança, por não apresentar perigo concreto ao bem jurídico, nem retirar o bem da esfera de vigilância e disponibilidade da “vítima”, configuraria crime impossível. Em síntese: “a norma jurídico-penal não tem necessidade de proibir condutas inidôneas” (CALLEGARI).

Nesse sentido, a seguinte ementa do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, em que foi relator o juiz Paulo Moacir Aguiar Vieira:

Tentativa de furto em supermercado. Crime impossível. Vigilante que controla desde o início todos os movimentos da ré, apreendendo a mercadoria e detendo a acusada quando essa procurava se retirar sem efetuar o pagamento. O pleno sucesso da ação preventiva de proteção ao patrimônio contrasta com a inidoneidade do meio empregado pela ré para lograr o propósito delituoso (art. 17 do CP). Absolvição por ser o fato penalmente irrelevante. (in CALLEGARI)

Em contrapartida, aduz MIRABETE: “configura tentativa a conduta do agente que esconde sob suas roupas a coisa que quer subtrair e é detido ao tentar passar pelo caixa do supermercado” (RJDTACrim 2/179, 6/78); e ainda, DELMANTO:


[...] Não há crime impossível, mas tentativa, se a impropriedade do objeto é relativa, como no caso de simples defeito mecânico do automóvel. (STJ, REsp 58.870, j. 22.3.95, in Bol. AASP nº 1.933). No mesmo sentido, se o agente é filmado em supermercado escondendo a res em sua calça, sendo preso em flagrante pela fiscalização do estabelecimento (TACrSP, RT 783/645). [...] (2002, p. 338).

Diante do exposto, apresentamos trecho de matéria extraído de página na internet, onde pode-se verificar situação semelhante ocorrida na Faculdade de Alagoas:

Seguranças da faculdade notaram as filmagens da última vez em que Marcelo Guimarães esteve na biblioteca da faculdade e viram que ele levava duas bolsas pesadas. Ontem, quando Marcelo Guimarães deixou a biblioteca, ele foi abordado e, com ele, estavam os livros Anatomia Atlas e Anatomia Humana, volume 1 e 2.

Os livros estavam escondidos embaixo da blusa do estudante. [...] (19 jan. 2008)

Na ocasião, o agente foi detido ao se constatar que este vinha subtraindo livros da biblioteca da faculdade, escondendo-os sob a roupa.

Diante deste caso concreto, vê-se, portanto, que as câmeras de vigilância não tornaram absolutamente ineficaz o meio empregado pelo agente, e sim tornaram sua eficácia apenas relativa. Caso o modus operandi adotado por aquele não fosse suficientemente eficaz para se atingir o resultado pretendido, o agente não teria subtraído outros livros da faculdade, ressalte-se, em diferentes ocasiões.

Sendo a conduta relativamente eficaz, há uma tentativa do agente em se valer dessa relatividade.

Pergunta-se, então: monitorar todos os passos do agente, desde o início da ação, torna impossível a consumação do delito? Se a resposta for positiva, o que devemos dizer que ocorreu quando nos depararmos com uma situação em que o agente – desde o início vigiado – conseguiu se retirar do estabelecimento com a res? Se o furto já era ex ante impossível, estaríamos diante de quê?

Assim, deve-se levar em consideração que nem todos os meios serão absolutamente ineficazes quando houver um sistema de vigilância no local. Isto porque ter os movimentos monitorados é diferente de tê-los “controlados”.

A outra questão abordada no texto é diferente. Enquanto que o simples ato de esconder um livro sob o casaco pode ser suficiente para subtraí-lo sob as vistas de um sistema de vigilância, o mesmo não o é quanto ao furto de mercadorias com etiquetas magnéticas.

Aqui, sim, vemos um meio absolutamente ineficaz para se furtar uma peça de roupa, por exemplo. O meio passaria, contudo, a ser relativamente ineficaz caso o agente se valesse de alguma tecnologia capaz de favorecer-lhe.

Utilizar-se tão-somente do ato de esconder a res debaixo da própria roupa, todavia, não seria suficiente para burlar esse tipo de tecnologia quando em perfeito funcionamento.

Lembremos que o art. 17 do CP utiliza termos extremos, quais sejam “absolutamente” e “impossível”. Desta forma, devemos entender que absolutamente ineficaz é aquele meio que se apresenta ineficaz a qualquer um e em qualquer momento, verificando-se as nuances do caso concreto.

O Exemplo mais comum de crime impossível é o caso do indivíduo que, desejando matar seu desafeto, dispara contra este com uma arma de fogo, ignorando, contudo, o fato de que sua vítima já se encontrava morta. O que vemos aqui é um caso inegável de crime impossível, pois, naquelas circunstâncias, seria impossível a qualquer um realizar a conduta típica prevista no art. 121 do CP, independentemente do meio empregado.

O desconhecimento do agente quanto ao estado de sua vítima não muda o fato de que o objeto se apresentava absolutamente impróprio à consumação do crime, pela falta do bem jurídico tutelado – a vida. Da mesma forma, para que os meios empregados na realização de uma conduta criminosa venham a ser considerados como absolutamente ineficazes, tais meios devem ser absolutamente ineficazes a qualquer um, em qualquer momento, do contrário não caberia a utilização do vocábulo “impossível”.


CONCLUSÃO


São requisitos para a configuração de crime impossível (art. 17 do CP), a “ineficácia absoluta do meio” ou a “absoluta impropriedade do objeto”.

Nos casos aqui apresentados, não há que se questionar quanto à impropriedade do objeto, pois trata-se de coisa alheia móvel, objeto literal do crime de furto. Toda a questão está em se aferir a absoluta ineficácia do meio empregado pelo agente.

“Absoluta” é a terminologia utilizada pelo Código Penal, o que torna necessária a existência de tal característica no caso concreto para que reste configurada a conduta típica do referido dispositivo legal.

Não sendo a conduta enquadrável nesses termos – sendo a ineficácia somente relativa – o crime deixa de ser impossível, passando a subsumir-se, quando frustrado por circunstâncias alheias à vontade do agente, na figura típica correspondente, em sua modalidade tentada.


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BIBLIOGRAFIA

CALLEGARI, André Luís. Crime Impossível: Furto em estabelecimento vigiado ou com sistema de segurança. BOLETIM IBCCRIM; São Paulo, nº. 69, p.16, ago., 1998.

DELMANTO, Celso et al.Código Penal Comentado. 6 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, vol.2: parte especial. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2007.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral: parte especial. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

RODRIGUES, Elaine. Estudante da UFAL é preso ao furtar livros da FAL. Tudo na Hora. Maceió, 19 jan. 2008. Disponível em . Acesso em 11 ago. 2008.
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Fernanda Karoline Oliveira Calixto
Ladislau Cordeiro dos Anjos


CONTRATO DE SEGURO


SUMÁRIO: 1.DEFINIÇÃO; 2.CARACTERES JURÍDICOS; 3.SUJEITOS; 3.1.Segurador; 3.2.Segurado; 3.3. Beneficiário; 4.OBJETO; 4.1.Interesse; 4.2.Risco; 5.OBRIGAÇÕES E DIREITOS; 5.1.Do Segurador; 5.2.Do Segurado; 6.EXTINÇÃO DO CONTRATO DE SEGURO; BIBLIOGRAFIA






O Código Civil de 1916, em seu art. 1.432, definia o contrato de seguro como sendo "aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante a paga de um prêmio, a indenizá-la do prejuízo resultante de riscos futuros previstos no contrato". O art. 757 do novo Código Civil, sem diferir materialmente da antiga definição, diz que o contrato de seguro é aquele pelo qual "o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados". A principal diferença diz respeito à utilização do termo “indenizar”, utilizado pelo Código de 1916 e abandonado pelo novel diploma civilístico. VENOSA apud LOUREIRO, considera impróprio o uso do verbo “indenizar”, uma vez que este envolve uma idéia de inadimplemento de obrigação e culpa, enquanto que no contrato de seguro o que há é uma contraprestação contratual. No entanto, o valor pago ao segurado é chamado de indenização.


Ao CC, tanto o de 1916 quanto o de 2002, coube a tarefa de disciplinar genericamente o contrato de seguros, enquanto que à legislação extravagante coube a disciplina das diversas subespécies de seguro, divisão esta que se faz mais apropriada ao imenso campo de abrangência atual dos seguros e à rápida evolução das necessidades sociais.

Importante ressaltar que o Código de Defesa do Consumidor aplica-se ao contrato de seguro como bem se depreende da leitura de seu art. 2º, caput, que conceitua: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” (grifou-se); e de seu art. 3º, §2º que diz: Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (grifou-se).



2. CARACTERES JURÍDICOS

O contrato de seguro é bilateral, oneroso, consensual, aleatório, de adesão, de execução continuada, e de boa-fé.

É bilateral, pois há constituição de obrigações para ambos os contraentes (sinalágma). As partes são sujeitos de direitos e deveres (ver capítulo cinco).


Oneroso, pois as vantagens dependem de um sacrifício patrimonial feito pelas partes.


Aleatório, visto que o pagamento da indenização pode não se fazer necessário. A equivalência ou não das obrigações, portanto, fica a cargo da álea (sorte). Contudo, lembra LOUREIRO: “Já existe um posicionamento mais inovador que aponta o caráter comutativo do contrato de seguro, afirmando que a contraprestação da seguradora é certa e que consiste na garantia, ou seja, em suprimir os efeitos de um fato danoso, ao menos quanto ao seu conteúdo econômico”.

De adesão, posto que no momento de sua celebração, apenas caberá ao segurado aderir ao que lhe é proposto. Isto se dá tanto pela superioridade econômica do segurador em relação ao segurado quanto pelo fato de haverem elementos como mutualidade e os cálculos de probabilidades – fundamentais ao seguro e necessários para definir o prêmio, a indenização e os riscos a serem cobertos – que não permitem seja celebrado um contrato distinto para cada segurado. Porém, não havendo modificação substancial do conteúdo do contrato, é possível a aposição de outras cláusulas acordadas com o segurado.

Pela situação de inferioridade do segurado diante da seguradora, a tendência legislativa é que se favoreça ao primeiro. Desta forma não há presunção de má-fé, que deve sempre ser demonstrada nos autos e, na dúvida, o segurador deve responder pela obrigação (RT, 585:127).

O próprio CC/02 traz expressamente em seu art. 423 a determinação de que: "Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente". Neste sentido, a jurisprudência confirma: “O contrato de seguro, típico de adesão, deve ser interpretado, em caso de dúvida, no interesse do segurado e dos beneficiários (RT 603:94)”.

De Execução Continuada, pois é feito para ter uma certa duração, ao longo da qual se protegerá o bem ou a pessoa. Obrigando-se o segurador a garantir os interesses do segurado durante a vigência do contrato.

Consensual, visto aperfeiçoar-se com o acordo de vontade das partes. A necessidade do documento (art. 758, CC/02) não faz dele um contrato formal, pois tal exigência possui apenas caráter probatório.

Em que pese ser esta a posição da maior parte da doutrina, há importantes juristas que defendem o contrário, a exemplo de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA e MARIA HELENA DINIZ que, baseada no art. 1.433 do CC, afirma "ser obrigatória a forma escrita, já que não obriga antes de reduzido a escrito, [...] A forma escrita é exigência para a substância do contrato" (apud LOUREIRO, p.02).
Diz-se que é de boa-fé porque além da boa-fé inerente a qualquer contrato há exigências específicas do Código em relação ao contrato de seguro, reforçando a necessidade das partes em agir de boa-fé e, conseqüentemente, agravando a situação daquele que assim não procede, pois a determinação legal foi mais do que lembrada. Assim, diz o art. 422 do Código Civil: "Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé"; e especificamente quanto aos dispositivos do instituto aqui em estudo, diz o art. 765. “O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes” (grifou-se). Como já mencionado, a má-fé de qualquer uma das partes não se presume, sendo necessária a sua comprovação.

Além dos dispositivos do Novo Código Civil, há também exigências de boa-fé por parte do Código de Defesa do Consumidor que, como já demonstrado, chancela também os contratos de seguro.



3. SUJEITOS

Da definição do Novo CC depreende-se a existência de duas partes: o segurador e segurado. No entanto, pode surgir a figura do beneficiário, terceiro que receberia a indenização no caso de seguros de vida e obrigatório contra acidentes de trabalho em que resultasse a morte do segurado. Este estaria contido na expressão "interesse legítimo do segurado".



3.1 Segurador

O segurador é a parte que recebe o prêmio, assumindo o risco e passando a ter a contraprestação de pagar a indenização caso ocorra o sinistro.


O Decreto-lei 2.063 de 7 de março de 1940 dispõe em seu art. 1º: “A exploração das operações de seguros privados será exercida, no território nacional, por sociedades anônimas, mútuas e cooperativas, mediante prévia autorização do Governo Federal.” O Código Civil, por sua vez, em seu art. 757, parágrafo único determina: "Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada".

As exigências quanto à espécie da pessoa jurídica, contudo, não são as únicas. Quando o art. 757 do CC/02 diz “legalmente autorizada”, significa que a entidade deve ter autorização do Ministério da Fazenda e tornar-se sujeita a fiscalização da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). Esta autorização será específica quanto ao ramo de seguros e à instituição será vedada a exploração de outro ramo de atividade econômica.

Exige-se ainda a constituição do capital mínimo exigido para o início do funcionamento da sociedade; depósito inicial do capital já efetivado no Banco do Brasil; exemplar do Estatuto da sociedade; e fiscalização pela SUSEP. Todas condições do Decreto-lei nº 2.063 necessárias ao funcionamento da seguradora.



3.2 Segurado

O segurado é a pessoa física ou jurídica que fornece periodicamente o prêmio à entidade seguradora para que esta assuma o risco de indenizá-lo em caso de danos sofridos, de acordo com o que foi contratado. Em princípio, portanto, a única exigência que se faz é que o segurado possua capacidade civil.


3.3 Beneficiário

O beneficiário é uma figura dos contratos de seguro de vida e no obrigatório de acidentes pessoais em que ocorrer morte. É a pessoa a quem é pago o valor do seguro, a "indenização". Esclarece LOUREIRO:

[...] no caso do seguro de vida, este pode ser relativo à vida do segurado, ou à vida de terceiro. Naquele, o beneficiário é um terceiro, já que resultaria impossível o segurado morto (risco coberto pelo seguro) receber a indenização; neste, no entanto, o beneficiário é o próprio estipulante. O estipulante, por sua vez seria quem paga o prêmio, mas não seria a sua vida o objeto da garantia do seguro, mas a de um terceiro, que não é parte do contrato. (p.2)


O CC traz no art. 793: "É válida a instituição do companheiro como beneficiário, se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou já se encontrava separado de fato".

Não poderá ser instituído como beneficiário aquele que estiver incapacitado de suceder.



4. OBJETO

4.1 Interesse

Sílvio Venosa aponta como objeto do seguro o interesse segurável. Atualmente, praticamente todos os interesses são passíveis de cobertura, com exceção dos excluídos pela lei, relativos a atos dolosos ou ilícitos e os de valor superior ao do bem.

O próprio Código Civil determina que o interesse a ser segurado deverá ser legítimo (art. 757), assim como todo e qualquer negócio jurídico, para ser válido, tem que ter objeto lícito.



4.2 Risco

O objeto do contrato de seguro, segundo Caio Mário da Silva Pereira, é o risco, definido por LOUREIRO como sendo “[...] evento futuro e incerto, o qual, em se concretizando, ensejará o cumprimento da contraprestação de "indenizar" por parte do segurador [...]” (p.2).

O risco consiste em "[...] acontecimento futuro e incerto previsto no contrato, suscetível de causar dano. Quando este evento ocorre, a técnica securitária o denomina sinistro" VENOSA apud LOUREIRO. É necessária a concretização do risco para que haja obrigação da seguradora quanto ao pagamento da indenização.

O risco baseia-se nas estatísticas e cálculos de probabilidade. Destarte, quanto maior a probabilidade de ocorrência do sinistro, maior a chances de a seguradora vir a pagar a indenização, o que significa dizer que seus fundos terão de ser maiores e, conseqüentemente, maiores deverão ser os prêmios.

A compreensão e interpretação são restritas. O contrato de seguro não admite que os riscos e termos sejam alargados, porém a cobertura inclui todos os prejuízos dele resultantes ou conseqüentes (art. 779 CC/02), salvo expressa disposição em contrário na apólice.

O risco não inclui ato ilícito praticado pelo segurado, pelo beneficiário ou pelos representantes ou prepostos destes. O CC/02, no art. 762, determina: "Nulo será o contrato para a garantia do risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro".



5. OBRIGAÇÕES E DIREITOS

5.1 Do segurador

A principal obrigação do segurador consiste em garantir o interesse legítimo do segurado. VENOSA apud LOUREIRO esclarece que obrigação de garantia é aquela cujo conteúdo é “[...] eliminar um risco que pesa sobre o credor. A simples assunção do risco pelo devedor da garantia representa, por si só, o adimplemento da prestação". Logo, não havendo o sinistro, não há obrigação do segurador de indenizar o segurado, que continuará obrigado ao prêmio.

O art. 786 do Novo Código Civil determina que "paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano". A súmula 188 do STF, por sua vez, traz: "O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até o limite previsto no contrato". O § 1º do artigo supramencionado representa exceção ao caput, prevendo que "salvo dolo, a sub-rogação não tem lugar se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, seus descendentes ou ascendentes, consangüíneos ou afins".

Além disso, a seguradora só pode pagar os valores devidos se possuir fundos, os quais provêem da reunião de todos os prêmios pagos.



5.2 Do segurado

São obrigações do estipulante: 1) pagar o prêmio acordado no ato de receber a apólice ou conforme tenha sido ajustado; 2) informar de maneira exata e completa todas as "circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio" (art. 766, CC/02); e 3) informar imediatamente ao segurador a ocorrência do sinistro.

1) pagar o prêmio acordado no ato de receber a apólice ou conforme tenha sido ajustado.



O descumprimento desta obrigação dá ensejo à rescisão contratual ou a caducidade da apólice. O pagamento pode ser anual e adiantado, ou em quotas mensais, sendo mais comum o primeiro. Admite-se a concessão de um prazo de graça, geralmente de 30 dias, após o recebimento da apólice a fim de que o prêmio seja pago e também se aceita a reabilitação do segurado em mora através do resgate do débito acrescido dos juros de mora. A lei, todavia, prevê que não terá o direito de indenização o segurado que estiver em mora no pagamento do prêmio em ocorrendo o sinistro antes que ela seja purgada (art. 763 NCC). [sic] LOUREIRO.



2) informar de maneira exata e completa todas as "circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio" (art. 766, CC/02). A inobservância deste preceito por má-fé do segurado o faz perder o direito à garantia além de obrigá-lo a pagar o prêmio vencido. O segurado deverá informar o segurador sobre incidente que possa agravar o risco coberto. Descumprida esta determinação (art. 769, CC/02) haverá perda ao direito de receber a indenização.

3) informar imediatamente ao segurador a ocorrência do sinistro. O segurador poderá exonerar-se em caso de omissão do segurado, mas para isso deve provar que se prontamente avisado poderia ter evitado o sinistro.



6. EXTINÇÃO DO CONTRATO DE SEGURO

O contrato de seguro pode extinguir-se pelas formas somente a ele peculiares – que são a ocorrência do sinistro e o fim do risco ao qual se pretendia prevenir –, e também pelos motivos comuns a todos os contratos, como a inexecução contratual, decurso do tempo nos contratos por prazo determinado, ou posterior alteração substancial na condição de uma ou ambas as partes.


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DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 3 Teoria Das Obrigações Contratuais E Extracontratuais. 24ª ed. Editora Saraiva – 2008.

FONSECA, Suiane de Castro. Seguro de vida . Jus Navigandi, Teresina, ano 1, n. 5, jan. 1997. Disponível em: . Acesso em:
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01 nov. 2008.

GONÇALVES, Carlos Roberto – Sinopses Jurídicas, Direitos das Obrigações 6, Parte Especial, Tomo I – Contratos – Editora Saraiva – 6ª Edição – 2002.

LOUREIRO, Carlos André Guedes. Contrato de seguro . Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: . Acesso em: 01 nov. 2008.

PEREIRA, Caio Mário da Silva – Instituições de Direito Civil, vol. III – Editora Forense – 10ª Edição – 2001.

VENOSA, Sílvio de Salvo – Direito Civil II – Editora Atlas S.A. – 2001.

VENOSA, Sílvio de Salvo – Direito Civil III – Editora Atlas S.A. – 2ª Edição – 2002.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

RESENHA JURÍDICA: Células-tronco, Anencefalia e Dignidade da Pessoa Humana.

A riqueza de conteúdo do termo “vida” torna difícil apreender seu sentido em um só significativo. Dado isso, cabe ao analisar a vida, como objeto de direito, que se a tome como um processo vital , composto elementos físicos, psíquicos e espirituais, sendo o bem maior a ser tutelado pelo Direito.
O Profº Luís Roberto Barroso em seu Artigo “Gestação de Fetos Anencefálicos e Pesquisas com Células-tronco: Dois Temas Acerca da Vida e da Dignidade na Constituição” traz uma reflexão concisa e inquietante sobre as temáticas do direito à vida e da dignidade da pessoa humana. Sua abordagem se faz ainda mais instigante em face de terem como parâmetro de análise duas recentes ações judiciais, em curso no STF. As referidas ações são a ADPF nº 54, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, onde se traz a tona a questão legitimidade ou não da interrupção de gravidez quando se trate de fetos anencefálicos, pleiteando que as normas do Código Penal referentes ao aborto sejam interpretadas conforme a Constituição, de modo que seja declarada sua não incidência em casos de antecipação terapêutica do parto em hipóteses de gestação de feto anencefálico; a outra ação a que o autor se propõe a discutir é a ADI nº 3.510, proposta pelo Procurador-Geral da República, em que é discutida a constitucionalidade ou não da Lei nº 11.105/2005, a Lei de Biossegurança, que estabelece a disciplina das pesquisas com células-tronco de embriões, requerendo-se a declaração de inconstitucionalidade do texto integral do art. 5º da lei, para que tais pesquisas sejam consideradas ilegítimas.
A anencefalia, em termos médicos, é a “má-formação fetal congênita por defeito do fechamento do tubo neural durante a gestação, de modo que o feto não apresenta os hemisférios cerebrais e córtex, havendo apenas resíduo de tronco encefálico”, afirma Luís Roberto Barroso. Neste ínterim, inexistem controvérsias quanto à fatalidade da anomalia, numa proporção de 100% dos casos, pois não há qualquer possibilidade de tratamento ou reversão do quadro. Por outro lado, a manutenção do feto anômalo é potencialmente perigosa para a gestante, uma vez que são altas as estatísticas de morte intra-útero destes fetos, causando danos à saúde da mãe e até perigo de vida. Portanto, a indicação terapêutica médica é a antecipação do parto.
Num outro contexto, as pesquisa com células embrionárias podem resultar na descoberta da cura de uma série de doenças, tais como as atrofias progressivas, as distrofias musculares, a esclerose lateral amiotrófica, as doenças de neurônio motor, a diabetes, o mal de Parkinson, síndromes diversas e uma série de outras doenças. Em todo mundo muitas são as pessoas afetadas por estas doenças, sendo que só no Brasil entre 3%e 15% da população têm doenças genéticas. Além disso, a diabetes afeta entre 10 e 15 milhões de pessoas.
Em que pese este debate ter fortes implicações éticas, principalmente no que concerne ao direito à vida e a dignidade da pessoa humana, a tese defendida pelo autor neste artigo é a de que tanto a antecipação terapêutica do parto em casos de fetos anencefálicos quanto nas pesquisas com células-tronco embrionárias inexiste violação ao direito à vida e à dignidade da pessoa humana.
Nessa linha de pensamento, aborda-se o que o autor chama de “desacordo moral razoável” em relação ao reconhecimento ou não de uma linha que separe o óvulo fertilizado da pessoa humana. As principais posições teóricas são a de que a vida humana começa: a) com a fecundação; b) com a nidação; c) quando o feto passa a ter capacidade de existir sem a mãe (entre a 24ª e a 26ª semanas de gestação); d) quando da formação do Sistema Nervoso Central. E há quem defenda que a vida começa quando da formação de uma consciência moral.
Desse modo, ao se perguntar então sobre a postura ética ideal nesta situação (de pluralidade e diversidade) percebe-se que qualquer atrelamento a dogmatismos ou positivos impensados é, no mínimo, incompatível com o regime democrático que norteia o Direito Brasileiro. Por isso, defende o autor a tese de que, nestas circunstâncias, a antecipação terapêutica do parto oferecerá à gestante a faculdade de decidir se quer levar a termo ou não uma gestação inviável. Mesma faculdade que se oferece aos genitores pela Lei de Biossegurança ao estabelecer a necessidade, em qualquer caso do “consentimento dos genitores”. Ao mesmo tempo, a Lei de Biossegurança vedou comportamentos condenados pela comunidade científica internacional, como a clonagem e a eugenia. Bem como, ao vedar e criminalizar a comercialização de material biológico, põe fim ao temor da criação de um mercado de embriões e tecidos humanos.
Mas, do ponto de vista jurídico, estas hipóteses, conforme o autor, são de simples resolução. Quanto à Antecipação terapêutica de feto anencefálico seus argumentos são os seguintes:
1. A antecipação terapêutica do parto não é aborto, logo, a conduta é atípica e não deve ser punida;
2. Ainda que se considerasse a antecipação terapêutica como aborto, a partir de uma Interpretação evolutiva do Código Penal, não seria conduta punível;
3. Sendo a questão interpretada conforme a Constituição e o princípio da dignidade da pessoa humana, a situação da mãe é análoga à tortura. Logo, ao invés de ser punida, deve-se, isto sim, permitir a antecipação terapêutica do parto.
Já em relação à Constitucionalidade e Legitimidade das Pesquisas com células-tronco embrionárias, seguem alguns argumentos do autor:
1. Inexiste violação ao direito à vida, já que, conforme o próprio Código Civil (art. 2º) é só a partir do nascimento com vida que surge a pessoa humana. Embora se resguarde os direitos do nascituro, este é definido como o ser humano já concebido, do qual se tem como fato certo o nascimento. Assim, o embrião inviável, que por isso não foi transferido para o útero materno não é pessoa, e nem sequer nascituro, posto que dele não se espera o nascimento como fato certo. Mais que isso, se pela lei, a vida acaba quando o SNC pára de funcionar, a vida só teria início quando este se formasse ou começasse a se formar.
2. Sobre a dignidade, se o embrião não é pessoa, não há que se fala em violação à dignidade humana;
3. E, conforme o próprio Luís Roberto Barroso,“[...] se os embriões não virão, de qualquer forma, a se tornar seres humanos, não haveria por que deixar de atribuir à sua curta existência um sentido nobre, que é o de promover a vida e a saúde de outras pessoas.” (p. 108)
Embora os argumentos favoráveis às questões em tela não se limitem aos supracitados, o autor os apresenta com a clareza e simplicidade que são próprias do seu estilo, trazendo à tona questões de extremada relevância para o Direito Constitucional.
Depreende-se de seu pensamento e do desenvolvimento científico e tecnológico que se apresentam ao mundo atual, que o Direito não pode ser ortodoxo ao ponto de manter posturas rígidas e cegas sobre antigas questões (o direito à vida e o respeito à dignidade da pessoa humana) que se apresentam com novas feições, diante das Cortes para serem julgadas, mas que não oferecem violações ao ordenamento jurídico .
Portanto, em questões difíceis, hard cases, como estes, a única alternativa sensata e em acordo com a Carta Magna Brasileira é a ponderação de interesses e o reconhecimento da não violação do direito à vida e do respeito à dignidade da pessoa humana.

BIBLIOGRAFIA

BARROSO, Luís Roberto. Gestação de Fetos Anencefálicos e Pesquisas com Células-tronco: Dois Temas Acerca da Vida e da Dignidade na Constituição. In CAMARGO, Marcelo Novelino (org.). Direito Constitucional: Leituras Complementares. Salvador: JusPOIVM, 2006.

_______. O direito constitucional e a efetividade de suas normas, limites e possibilidades da Constituição Brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1993.

quarta-feira, 30 de abril de 2008

"Navegar é preciso; viver não é preciso".




"Navegar é preciso; viver não é preciso".

sábado, 5 de abril de 2008

Blogs Interessantes

Aí vai uma lista de blogs que pode ser interessante visitarmos e linkarmos aqui ao nosso. Eles seguem mais ou menos a mesma linha e conteúdo para preencher nossas horas ociosas... bom, aí estão:

1. Direito na Sociedade da Informação
http://direitonasociedadedainformacao.blogspot.com/

2. Legis (um solidário blog sobre concursos)
http://legis.zip.net/

3. Rumos do Direito
http://rumosdodireito.blogspot.com/

4. Estudante de Direito (um site estilo blog comunitário)
http://www.estudantededireito.net/

5. Direito é Legal
http://direitoelegal.wordpress.com/


* Alguns desses blogs já estão inativos, mas o conteúdo antigo permanece.
** Não tive tempo de fazer mais do que passar os olhos pelos posts, então se algum dos blogs for impertinente ou coisa que o valha, retirem da lista - não vi direito.

- Posteriormente acrescentarei (acrescentam) outros.